Na última semana a briga entre Epic Games, dona do Fortnite (jogo multiplayer mais popular do mundo) e Apple ficou mais acirrada com a confirmação do banimento do game da App Store da Apple. Uma briga aparentemente empresarial, mas que carrega uma série de questões geopolíticas.
Tudo começou no dia 13 de agosto, quando a Epic Games lançou uma nova modalidade de compras dentro do Fortnite chamada “Mega Drop”. Esses pagamentos davam descontos de 20% nos V-Bucks (moedas para comprar itens no jogo) e só podiam ser realizados dentro do sistema da Epic Games, excluindo a Apple da jogada.
Contudo, essa prática da empresa de jogos viola os termos de uso da App Store da Apple, que obriga qualquer desenvolvedor de aplicativo a pagar uma taxa de 15% a 30% sobre todas as vendas realizadas dentro dos aplicativos baixados via App Store.
Ao identificar que a Epic Games infringiu essa regra a Apple baniu o jogo da sua loja. Quem já tinha efetuado o download antes do dia 13 de agosto ainda tinha acesso ao game, mas as pessoas que quisessem baixar o jogo após essa data não conseguiriam.
É a partir desse momento as coisas começam a ficar mais complicadas, pois quase que instantaneamente após receber a notícia do banimento do jogo a Epic Games lançou uma campanha publicitária extremamente agressiva contra a Apple.
Confira o vídeo lançado pela Epic Games contra a Apple:
A resposta da Epic Games é uma paródia à uma clássica propaganda da Apple inspirada no livro 1984, de George Orwell, mas nessa versão a desenvolvedora de games retratou a Apple como sendo o “Grande Irmão”.
A Epic Games entendeu que a Apple censurou seus produtos, mas a resposta ainda tem uma outra questão mais profunda. A partir disso a dona do Fortnite entrou com uma ação judicial contra a Apple pedindo a imediata recolocação do game na App Store.
Na última terça-feira (25) a Justiça americana deferiu a decisão dizendo que a Apple não era obrigada a recolocar o jogo na sua loja, sendo uma grande derrota para a Epic Games. Isso porque a desenvolvedora do game lançou na quinta-feira (27) uma nova temporada em Fortnite, que acabou ficando exclusiva para jogadores de console e PC e jogadores mobile mais antigos.
Monopólio das “Big Techs”
A resposta publicitária realizada pela Epic Games, usando a referência do livro 1984, não se resume apenas em uma paródia de outra peça publicitária da Apple. Ela também tem um significado muito mais profundo e ajuda na análise de uma questão que envolve poder político.
Em julho de 2020 o Congresso americano questionou as grandes empresas de tecnologia à respeito dos monopólios que gigantes como Apple e Google detém sobre ecossistemas digitais. Na ocasião foram chamados ao plenário americano (por meio de videochamada) alguns dos peixes grandes de companhias como Amazon, Facebook, Google e Apple para prestar esclarecimentos.
A questão central nesse debate é até que ponto o poder excessivo dessas empresas não cria um ambiente de monopólio dentro do mercado, o que fere a lei “antitruste” americana. Essa lei existe justamente para não permitir que existam concorrências desleais entre empresas em qualquer setor.
O poder que essas empresas detém acabou traçando uma linh tênue entre regulamentação de usos e censura, é nisso que a Epic Games se apegou para questionar as taxas de serviço praticamente abusivas da Apple.
Sendo a detentora de um mercado com mais de 1 bilhão de dispositivos espalhados pelo mundo, a Apple acaba ditando as regras como bem entende, nem sempre sendo justa com seus desenvolvedores.
Especificamente nessa briga a Epic Games acabou perdendo feio, pois, mesmo sendo dona do jogo mais popular da atualidade, a receita gerada pelo Fortnite representa apenas 0,04% do total da receita da Apple.
Mesmo assim, se outras empresas seguirem o exemplo da desenvolvedora de game e esse tipo de ação ficar massificada a Apple pode ser severamente afetada, visto que 17% da receita total da empresa hoje é oriunda de vendas de aplicativos de terceiros e licenças especiais.
Sendo uma porcentagem que já vem crescendo a anos e tem potencial de se tornar a principal fonte de recursos da empresa.
EUA X CHINA – Fortnite sendo peça na guerra comercial
Paralelo a tudo isso ainda existe a possibilidade da Epic Games ter feito toda essa manobra com o Fortnite para retaliar a empresa americana a fim de contra-atacar as represálias do governo americano, liderado por Donald Trump, contra empresas chinesas, como o TikTok.
Isso porque quem controla 40% da Epic Games é a gigante chinesa Tencent, maior portal de serviços de internet da China, sendo assim é natural que a empresa tenha interesses geopolíticos no sucesso do Fortnite.
Sendo líder dentro do mercado de jogos mobile, a Tencent tem poder de forçar a concorrência a seguir seu caminho e assim podemos estar observando mais um capítulo da guerra comercial tecnológica entre EUA e China.